Filiado a

Pesquisar
Close this search box.

Termelétricas devem operar por um longo período em 2013, prevê Abrage

Mais uma vez, assim como em 2001 e 2008, o Brasil passa por um momento delicado no que se refere ao abastecimento de energia elétrica. O fato de nossa matriz ser basicamente sustentada pela fonte hídrica nos torna vulnerável ao clima. A irregularidade de chuvas tem deixado os reservatórios das hidrelétricas em estados críticos. As caras termelétricas estão todas acionadas para não deixar a população sem energia. Embora o governo afirme que a situação está sob controle, “em função do quadro atual, pode-se prever que as termelétricas permanecerão operando na base por um longo período neste ano”. A declaração é do presidente da Associação Brasileira das Grandes Empresas Geradoras de Energia Elétrica, Flávio Neiva*, que em entrevista exclusiva para o Jornal da Energia, falou sobre o possível risco de desabastecimento de energia, sobre a necessidade do governo de realizar leilões específicos para viabilizar termelétricas, PCHs e biomassa, bem como dos desafios que o setor de geração enfrentará em 2013 após a Medida Provisória 579, que dispõe sobre a modicidade tarifária e a renovação das concessões. Confira a seguir os principais trechos da entrevista. 

O Brasil corre o risco de desabastecimento de energia ou de racionamento em 2013?

Flávio Neiva: Os reservatórios de regularização das hidrelétricas encontram-se atualmente com níveis de acumulação muito baixos para essa época do ano, sobretudo considerando que todas as termelétricas encontram-se operando na base desde o mês de outubro de 2012. Além disso, essa situação é agravada pelo fato de as vazões naturais estarem muito abaixo das médias. A situação da capacidade de abastecimento de energia elétrica em 2013 vai ficar mais previsível no final de janeiro, em função da ocorrência do volume de chuvas nesse mês. Mas em função do quadro atual pode-se prever que as termelétricas permanecerão operando na base por um longo período em 2013.

Como a Abrage vê a ausência de termelétricas a gás natural nos leilões?

Flávio Neiva: A maior restrição para a participação dessas termelétricas deve-se à reduzida oferta de gás natural. Nos últimos 20 anos não foram construídas usinas com grandes reservatórios e aquelas que serão construídas na próxima década também não terão reservatórios de regularização. Por isso, o parque de geração de energia elétrica reduziu sua capacidade de regularização plurianual das vazões, necessitando de expressiva complementação termelétrica para garantir o fornecimento de energia nos períodos de baixa hidrologia. Assim, torna-se imprescindível uma ação do governo para disponibilizar oferta de gás natural para geração termelétrica e também a realização de leilões específicos de geração termelétrica.

É bem vista pela associação a expansão da matriz elétrica brasileira com eólicas?

Flávio Neiva: As usinas eólicas têm importante papel de complementação da matriz elétrica brasileira e sua produção deve contribuir para o atendimento, de forma econômica, do suprimento de energia ao SIN (Sistema Interligado Nacional). Entretanto, a associação acredita que a expansão da matriz elétrica brasileira deverá continuar baseada nas fontes hidrelétricas e termelétricas.

Como vê a questão dos leilões regionais e por fonte?

Flávio Neiva: A Abrage entende que o governo deve analisar essa questão tendo em vista a disponibilidade regional de determinados recursos energéticos (ex: carvão na região Sul) e da necessidade de reforçar a geração regional para garantir a confiabilidade elétrica do SIN. A adoção de leilões regionais e por fonte iria ao encontro das pretensões do ONS (Operador Nacional do Sistema) no sentido de superar as restrições elétricas especificas de cada região do Brasil.

Qual deverá ser o futuro das PCHs e da biomassa: continuarão fora dos leilões em 2013?

Flávio Neiva: A matriz de energia elétrica brasileira necessita do aproveitamento de todas as fontes cuja produção possa contribuir para o atendimento, de forma econômica, da energia nos períodos de ponta e fora da ponta, em âmbito nacional e regional. O planejamento governamental da expansão do parque gerador deve prever a participação das PCHs e biomassa considerando suas especificidades nos próximos leilões.

Na percepção da Abrage, qual tema relacionado ao setor de geração deverá ser mais bem debatido em 2013?

Flávio Neiva: Com certeza os temas relacionados à regulamentação da MP 579/12 terão um grande desdobramento nesse ano, assim como o debate sobre os regulamentos que tratam do licenciamento ambiental de novas usinas e de usinas em operação merecerão destaque na agenda do setor em 2013. Também serão objeto de debates os novos procedimentos para redução/ eliminação das inadimplências na liquidação financeira na CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) e a regulamentação da Portaria 455 do MME (Ministério de Minas e Energia).

O licenciamento ambiental tem sido um gargalo para que empreendimentos hidrelétricos consigam participar dos leilões. Na opinião da Abrage, essa questão está sendo devidamente enfrentada pelo governo?

Flávio Neiva: O governo federal está empenhado em redefinir o processo de licenciamento ambiental e já sinalizou que em 2013 será realizado um trabalho envolvendo todos os ministérios que participam desse processo, com o objetivo de estabelecer uma legislação que compatibilize o desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente, da arqueologia e da população existente nas regiões afetadas pela implantação dos empreendimentos. A Abrage acredita que esse trabalho é imprescindível para permitir a expansão da oferta de energia que será necessária ao desenvolvimento econômico e social do Brasil.

Em que estágio se encontra as discussões sobre a repotenciação de usinas e que ganhos isso pode trazer para o setor e para o consumidor?

Flávio Neiva: Com a MP 579, a repotenciação das UHE’s deverá ser reanalisada, tendo em vista que praticamente todas as usinas que possuem a previsão para instalação de novas unidades com baixo custo e reduzido impacto ambiental foram atingidas pela MP 579. Cabe ressaltar que esse assunto encontra-se em fase de regulamentação pela Aneel.

Acredita que neste ano haverá alguma sinalização do governo mais concreta para a geração solar fotovoltaica em larga escala?

Flávio Neiva: Para a geração solar fotovoltaica já existe legislação que incentiva sua utilização na forma de geração distribuída, o que permite ao gerador de pequeno porte intercambiar com a sua distribuidora a parcela da geração fotovoltaica não consumida. Em decorrência da ampliação dessa utilização de painéis fotovoltaicos pode-se prever uma progressiva redução do seu custo de produção e consequentemente sua utilização em larga escala.

O ano de 2012 foi pautado, em suma, pelas discussões em torno da renovação das concessões vincendas. Podemos virar a página sobre esse tema ou o assunto ainda deve ter novos desdobramentos em 2013?

Flávio Neiva: A Abrage acredita que no ano de 2013 ainda teremos muitos desdobramentos da MP 579. Nesse contexto incluem-se, principalmente, a metodologia de aprovação, remuneração e ressarcimento dos investimentos (ampliações, modernizações, etc.) nas usinas prorrogadas e também o ressarcimento das despesas com grandes reparos e reformas nessas usinas. A regulamentação da MP 579 pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) deverá ser objeto de audiências públicas com grande participação das concessionárias de geração, tendo em vista a importância da definição dos itens de despesa que serão cobertos pela Tarifa Inicial de Geração e os procedimentos para aprovação e forma de ressarcimento pela Aneel de despesas de outros itens não cobertos pela Tarifa Inicial, sobretudo de investimentos necessários para ampliação, reforma e modernização das UHE’s. A MP 579 trouxe grandes mudanças para o setor elétrico brasileiro e, por isso, o ano de 2013 será um ano de grandes desafios para o setor e para a Abrage também.

A Abrage sempre manteve a posição de que o melhor seria prorrogar as concessões por mais 30 anos e que os benefícios capturados com a renovação fossem destinados a diminuir encargos do setor. Após três meses de discussão sobre a MP579, qual é a avaliação que a associação tem da solução dada pelo governo para as concessões vincendas?

Flávio Neiva: A Abrage sempre defendeu que o custo da energia das usinas a serem prorrogadas não remunerasse os ativos já amortizados dessas usinas. Ao mesmo tempo, suas propostas também contemplaram a necessidade de as empresas terem recursos suficientes para fazerem a gestão completa das usinas prorrogadas, incluindo a cobertura de todos os serviços necessários para manter a disponibilidade e a confiabilidade da energia produzida e para atender a todos os requisitos legais, ambientais e regulatórios demandados pela Aneel. Entretanto, as tarifas definidas pelo poder concedente para a remuneração das usinas prorrogadas não permitem a completa cobertura desses compromissos e esse é um ponto de grande preocupação para a associação e já foi motivo de inúmeras interações da Abrage com os órgãos institucionais no sentido de mostrar a incompatibilidade das tarifas com todas as responsabilidades atribuídas às empresas geradoras.

Sobre as geradoras que aderiram à nova Lei e concordaram em operar e manter ativos pelos próximos 30 anos. Quais serão as principais barreiras a serem superadas por esses agentes?

Flávio Neiva: A Abrage entende que a maior dificuldade a ser enfrentada por essas empresas será a adequação dos inúmeros compromissos trabalhistas, legais, ambientais e regulatórios das usinas prorrogadas com os recursos financeiros limitados que receberão para administrar essas concessões.

No caso de Cesp, Cemig, Celesc, Celg GT e Copel que optaram por não renovar parte dos ativos de geração. Elas são favoritas para arrematarem novamente esses ativos numa nova licitação? Que tratamento acha que o governo dará a esses ativos? 

Flávio Neiva: A Abrage acredita que os ativos das empresas que não optaram pela sua prorrogação serão licitados ao término de suas concessões, conforme informações já anunciadas pelo Poder Concedente. Pode-se inferir que as empresas que já operam as usinas levariam alguma vantagem num leilão desses ativos por já conhecê-los e por já disporem de estrutura para operá-los, mas num leilão poderão surgir competidores que possuem experiência e condições de também assumirem o grande desafio que será o de receberem valores baixos de tarifa para atender a inúmeros e complexos compromissos dessas usinas, conforme mencionamos anteriormente.

A decisão desses agentes de não renovar parte dos ativos de geração foi acertada?

Flavio Neiva: A Abrage entende que a opção de cada agente foi uma decisão particular, pautada em uma análise econômico-financeira da oportunidade oferecida pelo Poder Concedente, incluindo a oferta de remuneração pelos serviços a serem prestados, versus os riscos e compromissos a serem assumidos pela usina pelos próximos 30 anos.

Qual é a avaliação da Abrage do resultado do leilão de compra de energia nova A-5, ocorrido em dezembro de 2012. A baixa contratação de energia a preços “excepcionais” sinaliza para um cenário desfavorável para expansão do setor neste ano?

Flávio Neiva: O leilão A-5 contratou apenas 574 MW entre hídricas e eólicas. Lamentavelmente, a UHE Sinop (400 MW – MT), maior das hidrelétricas inscritas, não foi arrematada, apesar de ter tido interessados. No segmento eólico, o preço médio da energia vendida no certame, de R$ 87,94/MWh, foi o mais baixo para a fonte. Além disso, as distribuidoras declararam uma baixa demanda de energia no leilão – em torno de 300 MW médios – resultado, além do baixo crescimento econômico nacional, da previsão conservadora das empresas em razão da indefinição sobre a distribuição das cotas de energia da MP 579 e das incertezas relacionadas ao possível cancelamento de contratos das UTE´s do Grupo Bertin. Entretanto, no nosso entendimento, não está caracterizado um comprometimento da expansão do setor em função das medidas implantadas pelo Poder Concedente. Com certeza, uma das variáveis que mais influencia a disposição dos agentes pelos investimentos na expansão da oferta de energia é o risco ambiental dos projetos oferecidos e, nesse ponto, acreditamos que a legislação e os regulamentos sobre o tema têm que ser aperfeiçoados para afastar os custos imprevistos desses projetos.

Acredita que o resultado do leilão foi afetado de alguma forma pela MP579?

Flávio Neiva: Os leilões de energia nova têm uma estrutura de funding e de remuneração que independe das regras estabelecidas pela MP 579/12. E, com certeza, os leilões de energia nova serão sempre uma boa alternativa para todas as empresas que desejarem expandir seus parques geradores, inclusive para aquelas alcançadas pela MP579.

*Flávio Neiva é engenheiro eletricista e ocupou o cargo de diretor de Produção e Transmissão na Cemig. É conselheiro do Conselho Consultivo da Empresa de Pesquisa Energética (CONCEPE) e preside a Abrage desde 1998.

Últimas Notícias