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Entrevista: O mercado livre em 2013 pós-MP579 e 455

Presidente da Comerc Energia, Cristopher Vlavianos, falou sobre os impactos da MP579 e da portaria 455 no mercado livre e sobre a atuação da CCEE e de plataformas de negociação, como Brix e BBCE Por Wagner Freire, de São Paulo (SP)

A partir de 2013, as comercializadoras e consumidores livres terão a necessidade de se adequar as modificações que ocorrerão no Ambiente de Contratação Livre (ACL) de energia elétrica, muito por causa da Medida Provisória 579 e a Portaria 455. Enquanto a MP579 deve impactar na liquidez da energia negociada no mercado de livre, a 455 deve impor novos custos às comercializadoras, exigindo delas um aumento de mão de obra por causa dos contratos ex-ante com ajustes semanais. “O volume de trabalho dos gestores de energia vai aumentar demais”, afirma Cristopher Vlavianos* presidente da Comerc Energia.

Mas nem tudo são más notícias. A perspectiva da criação da figura do “Comercializador Varejista” também é bem vista por Vlavianos. “Isso diminuirá muito o trabalho das comercializadoras. Ela (a comercializadora) passa a poder administrar o ponto de carga do consumidor”, explica o executivo. “É extremamente benéfico para todo mundo, inclusive para a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) que vai ter menos processos.”

Para ele, não há mais obstáculos para a implementação do comercializador varejista. “Muita coisa foi discutida em termos de inadimplência: como ficaria um consumidor inadimplente, como ficaria uma comercializadora inadimplente. Mas dentro das discussões já se chegou a alguns parâmetros interessantes. Acho que não tem mais nenhum obstáculo, é só implementar mesmo.”

Vlavianos ainda criticou a criação de um índice de preços no marcado livre proposto pela 455. Ele também avaliou a contribuição da CCEE e de plataformas como Brix e BBCE para o desenvolvimento do ACL. Confira abaixo os principais trechos da entrevista do presidente da Comer Energia:

A Comer Energia faz gestão de quantos agentes no mercado livre atualmente?

Hoje são 50 geradores, sendo a maioria biomassa. E de consumidores livres nós temos 265 unidades de consumo, o que representa aproximadamente 210 empresas. Mas temos contratadas outras 500 unidades consumidoras, que não estão hoje, mas estão programadas para migrar até o final de 2014. Isso porque o consumidor vai entrando de acordo com o vencimento do contrato cativo dele.

Quantos MW médios foram negociados pela Comerc Energia em 2012?

A gente trabalha com dois balanços, um de operações de longo prazo – que é o que interessa para gente – e o de curto prazo. O de longo prazo está em torno de 370MW médios, enquanto o de curto prazo varia entre 200MW até 300MW médios negociados. Como a volatilidade dos contratos de curto prazo é muito grande, então a gente separa essa operação. Ou seja, você tem um portfólio de contratos de longo prazo, e os de curto vão se somando. Na média deste ano negociamos cerca de 600MW médios por mês.

Qual a sinalização para esses números em 2013?

Deve aumentar. É importante explicar que o volume negociado está muito ligado ao PLD (Preço de Liquidação das Diferenças). Quando o preço do indicador fica muito alto, os consumidores acabam flexibilizando os contratos de uma forma diferente, contratando menos energia. Então, esse efeito de PLD alto reduz o volume de energia negociado. Mas imaginamos que essa situação deve se estabilizar no ano que vem e a contratação deve aumentar — tanto de novas migrações para o mercado livre quanto de operações de volumes maiores no mercado de curto prazo.

Então o PLD alto diminui a liquidez do mercado?

Exatamente.

Em sua opinião, a Medida Provisória 579 é prejudicial para o Ambiente de Contratação Livre?

No contexto da alocação de cotas foi. Se olharmos pelo ponto de vista da redução de energia, isso é bom para todo mundo. Mas a alocação de cotas só para o consumidor cativo diminui a competitividade do mercado livre. Quer dizer, você está dando um benefício para o mercado cativo que você não está dando para o mercado livre. Então, a gente espera que o governo reveja essa isso com as emendas e que, considerando que esses consumidores livres também ajudaram a amortizar o investimento dessa geração, que fossem alocadas também essas cotas para o consumidor livre, para equipará esse equilíbrio entre o mercado cativo e livre. Mas olhando o contexto, a MP579 da forma como foi colocada, ela acaba privilegiando o mercado cativo em detrimento do mercado livre sim.

Com essa falta de isonomia entre mercados, o governo demonstra que a preferência é o cativo?

O governo é a favor de que a expansão do mercado livre seja feita de uma forma mais controlada. Quando ele vê que os consumidores cativos estão indo numa velocidade muito grande para o mercado livre, isso preocupa o governo. Preocupa em termos de expansão de geração. O modelo de expansão de geração foi feito dentro do contexto do mercado cativo. Como o consumidor livre sai desse mecanismo, o agente passa a não ser mais uma carga administrada pela distribuidora, declarada; ele passa ser uma carga volátil. E essa carga volátil é motivo de preocupação para o governo. Toda vez que se vê esse movimento muito intenso, esse volume de migração de consumidor para o livre muito rápido, existe uma preocupação do governo.

Quanto a carga do mercado livre hoje representa no consumo de energia brasileiro?

São 12.500 MW médios, representando 27% do consumo do País. A Comerc Energia faz a gestão de 13% desse mercado.

Essa porcentagem da Comerc pode aumentar?

Existem algumas medições. Quando falamos em volume de carga, para aumentar esses 13% é preciso ter cargas maiores para dentro da empresa. Que não é o caso desses novos consumidores previstos. Esses novos consumidores são os que migram para o mercado com fonte renovável, que consomem menos energia, são consumidores médios; não grandes. Então, como o mercado tende a se expandir por essa base (de médios consumidores) temos um crescimento em volumes de unidades e de energia não tão grande. Hoje o consumidor especial (0,5 a 3MW) já passa os consumidores livres (acima de 3MW). São mais de 800 consumidores especiais no mercado e 500 livres, mas a carga do especial é 10% da somatória do livre. Quando você prega o mercado livre em si, os grandes consumidores de cargas de energia (que já foram para o mercado livre) acabam por estabilizar esse crescimento em termos de carga. Mas em termos de volume de consumidores a gente espera crescer 40% em 2013. Neste ano nós crescemos em número de unidades 150%.

A criação do comercializador varejista beneficia as comercializadoras?

Muito. Isso diminuirá muito o trabalho das comercializadoras. Ela (a comercializadora) passa a poder administrar o ponto de carga do consumidor. Hoje os consumidores grandes são os que procuram ter a sua carga separada e administrar a própria carga, mas para o consumidor pequeno é um trabalho e uma burocracia muito grande para a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica). Então, uma vez que você possa colocar esse consumidor dentro do seu ponto de carga e cuidar dele, como uma pequena distribuidora — que você está operando a carga desse consumidor e diminuindo o trabalho que ele tem — é extremamente benéfico para todo mundo, inclusive para a CCEE que vai ter menos processos.

Qual seria o grande obstáculo para a implementação do comercializador varejista?

Muita coisa foi discutida em termos de inadimplência: como ficaria um consumidor inadimplente, como ficaria uma comercializadora inadimplente. Mas dentro das discussões já se chegou a alguns parâmetros interessantes. Acho que não tem mais nenhum obstáculo, é só implementar mesmo.

Qual a sua opinião sobre a Portaria 455/2012?

A 455 tem duas medidas. Uma delas é a divulgação do preço dos contratos; e a outra é a parte de registro dos contratos, que seriam feitos ex-ante, com ajuste semanal. Para nós, a parte de registro de contratos vai aumentar muito o trabalho. Em vez de fazer um registro mensal você vai ter que fazer quatro. O volume de trabalho dos gestores de energia vai aumentar demais. Isso não é nada diferente do que fazemos hoje, vamos ter que nos adequar e fazer, o que inclui contratar mais funcionários. Isso significa aumentar os custos, porque você está trazendo mais gente e tendo mais trabalho por consumidor. Eu prefiro ver na prática se realmente isso (455) vai funcionar. O que vai acontecer é que você vai ter de apurar muito mais os ajustes; vai ter sobra de energia de consumidor por causa de máquina parada, de fábrica parada, e vai ter que liquidar essa operação na CCEE. Não sei se o balanço desse processo é positivo. Acho que precisaria verificar se essa nova sistemática de garantias não seria suficiente para diminuir esse risco. O contrato ex-ante, eu não tenho como precisar, mas acredito que não tem efeito nenhum. É mais trabalho mesmo.

E quanto à divulgação dos preços?

Hoje existe uma percepção de algumas pessoas nesse setor que o consumidor fica alheio ao preço, ou que existe algum oligopólio. Isso não é verdade. Todos os processos que a gente faz, tanto para grandes consumidores quanto para os consumidores menores, são todos competitivos. A competitividade desse mercado é muito grande. Às vezes fazemos um processo de compra de energia e aparecem 20 geradores vendendo energia. Os caras brigam até o fim. Então, o consumidor não é prejudicado por esse movimento. Muito pelo contrário, o consumidor é beneficiado por essa competitividade. A divulgação do preço tem que ser acompanhada de uma realidade. São vários contratatos diferentes, nós não estamos falando de um contrato padrão. É preciso ter muito cuidado no tratamento dessas informações, para que não se vaze informações de contratatos fechados entre empresas, porque aí isso seria danoso. Agora, mesmo que você consiga chegar num parâmetro real, você estará sempre olhando para trás, para o momento anterior. No dia que você divulgar o preço, por exemplo, do dólar, você divulgou o preço do dólar de ontem; o dólar de hoje está rolando. Então, eu não vejo nenhum efeito em relação a isso também. Se isso vier acompanhado de algumas outras informações pode até ser que seja interessante. Essa informação utilizada de forma correta, para questão de expansão, de análise, de custo de contrato, pode até ser uma informação relevante, mas não em função do consumidor. O consumidor é bem informado. Ele não tem necessidade de saber qual foi o preço de ontem, ele tem necessidade de saber qual o preço de amanhã.

Qual a sua avaliação sobre a atuação da CCEE?

A CCEE tem a função de câmara de liquidação. Ela estaria muito mais para uma CETIP do que para uma BM&FBovespa, por exemplo. Eu não vejo a CCEE como uma bolsa. Acho que ela tem outros trabalhos a serem desenvolvidos. Tem outros que estão no mercado, com tecnologia e novos produtos para assumir esse papel de bolsa. O trabalho que a CCEE faz, ela faz muito bem, melhorou toda essa parte de sistema, foi extremamente corajosa nesses casos de inadimplência. O pessoal foi realmente além da obrigação deles para proteger o mercado. Acho que a CCEE tem um papel fundamental. O que precisa é separar o que realmente a CCEE precisa fazer. Temos outros agentes que podem cumprir essa necessidade de bolsa de energia.

Em que plataformas como Brix e BBCE ajudam o mercado?

Elas trazem liquidez, transparência de preço. Isso realmente é uma coisa interessante. O acesso ao preço todo mundo tem. Isso é um fator importante nesse mercado. Mas nenhuma dessas plataformas ainda é uma bolsa. São balcões organizados de negociação de energia. Mas não tem uma característica de bolsa. A característica de bolsa é você operar contra a bolsa, é você ter uma sistemática de garantia. E a sistemática de garantia para uma commodity volátil desse jeito é cara. O que encareceria muito esse processo. Então, eu acho que para gente formar bolsa no futuro a gente teria que mudar essa sistemática de preço. O preço não poderia ser um preço técnico, teria que ser um preço de mercado. Teria que ser um preço muito mais aderente à realidade dos contratos do que um preço técnico que varia num ano de R$20MWh a R$ 450MWh. Não tem operação de garantia que segure uma volatilidade dessa. É um começo (as plataformas), mas ainda precisa de muita evolução.

*Quem é: Cristopher Vlavianos é economista formado pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP-SP), com experiência nos mercados financeiros, de commodities e energia. É um dos fundadores da Comerc Energia. Com atividades iniciadas em 2001, a Comerc Energia é formada por duas empresas: a Comerc Gestão e a Comerc Trading. A Comerc Gestão é a maior gestora independente de energia elétrica do País, responsável por gerir 13% da carga de energia de consumidores livres.

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